Leio
na Folha o seguinte título: “SP culpa consumidores por falta de água na
madrugada”. O lead da reportagem é este: “O governo paulista está
responsabilizando os moradores sem caixa-d’água pela rotina de torneiras secas
durante as madrugadas em diferentes pontos da Grande SP”.
Aí a reportagem informa:
“Ontem (12/11), em sessão da CPI da Sabesp, na Câmara Municipal, o secretário estadual Mauro Arce (Recursos Hídricos) disse que o problema da falta de água “nasce principalmente na falta de atendimento” a uma norma técnica da ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas). Na interpretação do governo, essa regulamentação obriga as pessoas a terem uma caixa-d’água em seus imóveis para permitir o abastecimento por 24 horas. O texto da norma, entretanto, não é tão taxativo. Os edifícios são realmente obrigados a instalarem caixas-d’água para um dia inteiro de consumo. Mas, para casas de menor porte, existe apenas uma recomendação de que sejam instalados reservatórios de 500 litros. (…) Após o depoimento na Câmara, ao ser questionado se o problema da falta de água ocorria pela ausência de caixas-d’água nas casas, o secretário disse: “Exatamente. [O problema] é a falta de caixa adequada. Muitas vezes tem caixa, mas não adequada”.
Não
sei se o secretário usou a palavra “culpa” ou se isso foi, digamos, uma livre
interpretação. Tendo a achar que foi livre interpretação.
Eu
sempre estranhei essa história de morador reclamar de falta de água “de
madrugada”. Pensava cá comigo: “Mas essa gente não tem caixa d’água?”. Não!
Moram em favelas, em acampamentos, em aglomerados sem nenhuma infraestrutura?
Nada disso! São casas de padrão médio, regulares. Então o cara tem dinheiro
para comprar celular e mandar filmes para o Fantástico sobre a
“falta de água de madrugada”, mas não para instalar uma caixa d’água?
Que
se reitere: o secretário não “culpou” ninguém. Esse é o tipo de imputação que
vira título e vai parar em campanha eleitoral sem que o fato tenha acontecido.
Mauro Arce, que é um homem público decente, explicou o óbvio: se a diminuição
de pressão — e ela existe — leva a que falte água em alguns bairros (atinge 2%
da população) e se não existe uma caixa d’água, então a casa ficará… sem água.
Eureca!
Também
na Folha leio o protesto de um cidadão: “Ninguém me avisou. Aí avisam
isso só agora”. Que
é isso, rapaz? O estado-babá precisa agora avisar que é preciso ter uma caixa
d’água? Você chegou à idade adulta, casou e se reproduziu sem saber que é
preciso ter uma simples caixa d’água? Será necessário, em breve, criar a “Bolsa
Caixa d’água”? Confesso que fico espantado com o esgar crítico da imprensa, não
só da Folha, com a fala do secretário, como se ele estivesse sendo hostil ao
consumidor ou fazendo uma exigência absurda. Não está.
A
cultura da reclamação está gerando no Brasil o cidadão-bebê. Logo
será preciso dar comida na boquinha do indignado cidadão. Que é que há? Estamos
gerando o povo gugu-dadá. Tenham paciência! Tentou-se decretar a todo custo que
havia um racionamento de água, quando não há. Agora apareceu a questão da caixa
d’água…
Ainda
que a lei não obrigue alguém a ter uma caixa d’água — e me parece que obriga —,
há coisas que são de bom senso, não é mesmo? O estado não inventou o indivíduo.
Os indivíduos é que inventaram o estado. Continuam autônomos para agir em seu
próprio benefício desde que não transgridam a lei. A imprensa precisa se
preparar para a possibilidade de o povo, às vezes, estar errado, ser relapso.
Nem sempre o governo é culpado.
Ô
meu! Vá instalar uma caixa d’água e pare de choramingar! Estão vendo por que eu
jamais serviria para ser um político ou um homem público?
Por Reinaldo Azevedo
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