terça-feira, 10 de março de 2015

DILMA E O INQUÉRITO – Youssef disse que Dilma sabia de tudo, e Janot não pediu que se abrisse investigação

Você tem todo o direito, leitor amigo, de achar que Rodrigo Janot, procurador-geral da República, fez bem em não pedir que se abrisse um inquérito para apurar a atuação de Dilma Rousseff. Aliás, tem o direito também de se conformar com um argumento ruim ou falso. Mas eu não lhe cassarei o direito de saber disso.

Vamos ver. A imprensa foi praticamente varrida, tomada, impregnada, pela informação, diligentemente saída da Procuradoria-Geral da República, segundo a qual Janot não poderia ter pedido abertura de inquérito sobre a atuação de Dilma por uma limitação constitucional. Afinal, tonitruou Janot, o parágrafo 4º do artigo 86 da Carta é explícito: “O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções”.

Pois é… O relato do depoimento do doleiro Alberto Youssef, do dia 3 de outubro do ano passado, informa: “Eram comuns as disputas de poder entre partidos relacionadas à distribuição de cargos no âmbito da Petrobras e que essas discussões eram finalmente levadas ao Palácio do Planalto para solução; [Youssef] reafirma que o alto escalão do governo tinha conhecimento”.

O doleiro, meus caros leitores,  deu os nomes: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a atual presidente, Dilma Rousseff, e os ex-ministros José Dirceu, Edison Lobão, Ideli Salvatti, Gleisi Hoffmann, Gilberto Carvalho e Antonio Palocci. EU ESTOU ENGANADO, OU GLEISI HOFFMANN SÓ PASSOU A SER PRIMEIRO ESCALÃO NO GOVERNO DILMA, QUANDO FOI PARA A CASA CIVIL?

Vamos a uma questão nível “Massinha I” de Lógica Elementar: digamos — e isto não está evidenciado — que Youssef se referisse apenas à Dilma ministra, não à Dilma presidente: quer dizer que ela sabia de tudo quando estava no ministério e passou a esquecer tudo quando virou presidente?

Ainda se poderia objetar: “Ah, mas Youssef não apresentou provas contra Dilma…”. Certo! E “provas” irrefutáveis contra todos os outros? Existem? Querem um exemplo? Paulo Roberto Costa diz que Antonio Palocci pediu, por intermédio de Youssef, R$ 2 milhões para a campanha de Dilma em 2010. O doleiro nega. E aí?

Na entrevista que concedeu em defesa de Janot, Alexandre Camanho de Assis, presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República — entidade sindical que elege o procurador-geral!!! —, afirmou o seguinte:

“Queremos apenas saber se houve crime, que provas são essas, levar as investigações adiante e, só então, haver o pedido de condenação, respeitado o devido direito de defesa e contraditório. O MP tem o dever de levar tudo ao Judiciário e, caso os indícios não sejam confirmados, até mesmo pedir a absolvição dos envolvidos. Mas está havendo muito açodamento, como se o pedido de investigação fosse a própria sentença”.

Ok. Concordo com doutor Camanho. Só quero saber por que essa regra vale para Palocci, os demais petistas, para o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), para o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) ou para o também senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), mas não vale para Dilma Rousseff.

A menos, claro!, que alguém me prove que Youssef se referiu a Dilma só até 31 de dezembro de 2010. Eu lido com fatos, com lógica e com leis. Se alguém tiver instrumentos mais precisos, que os empregue. Esses são os meus.
*
PS – Estou pouco me lixando se Cunha, Renan e até o petista Humberto Costa também reclamam de Janot. Eu não aplaudirei, por isso, uma decisão do procurador-geral que considero errada. Sabem por quê? Renan, Cunha e Costa não tomam decisões no meu lugar; não fazem escolhas por mim. Eu não me obrigo a aprovar quem eles reprovam. Segue sem explicação o fato de Janot não ter pedido abertura de inquérito para Dilma Rousseff. A justificativa apresentada, lamento, não para de pé. 


Por Reinaldo Azevedo

DILMA E O IMPEACHMENT – Anotem: No dia 9 de março de 2015, ela teve de falar “da coisa”. Ou: golpismo é rasgar a lei. Ou: Terceiro turno uma ova!

Anotem aí: nesta segunda-feira, dia 9 de março de 2015, a presidente Dilma Rousseff foi obrigada a falar sobre a possibilidade de impeachment de seu próprio mandato. As palavras lhe saíram, como de hábito, um tanto confusas. Havia até uma coisa ou outra que faziam sentido. Já chego lá. Antes, quero aqui lembrar uma coisa importante. SABEM QUANDO DILMA ADMITIU PELA PRIMEIRA VEZ A POSSIBILIDADE DE HAVER ROUBO NA PETROBRAS? SÓ NO DIA 18 DE OUTUBRO DO ANO PASSADO, A UMA SEMANA DO SEGUNDO TURNO. A Operação Lava-Jato havia sido deflagrada em… março. E ela o fez deste modo: “Eu farei todo o meu possível para ressarcir o país. Se houve desvio de dinheiro público, nós queremos ele de volta. Se houve, não: houve, viu?”. Em cinco meses, Dilma teve de ir da quase negação da roubalheira à possibilidade do impeachment, ainda que para negá-la.

Nesta segunda, logo depois de sancionar a tal lei do “feminicídio”, ela concedeu ali uma rápida entrevista. Indagada sobre o panelaço que se fez ouvir país afora enquanto ela discursava, afirmou:

“O Brasil tem uma característica que eu julgo muito importante e que todos nós temos de valorizar, que é o fato de que aqui as pessoas podem se manifestar, e têm espaço para isso, e têm direito a isso. Eu sou de uma época que, se a gente se manifestasse, fizesse alguma coisa, acabava na cadeia, podia ser torturado ou morto. O fato de o Brasil evoluir, passar pela Constituinte de 1988, passar por processos democráticos e garantir o direito de manifestação é algo absolutamente valorizado por todos nós, que chegamos à democracia e temos de conviver com a diferença. O que nós não podemos aceitar é a violência, qualquer forma de violência não podemos aceitar, mas manifestação pacífica, elas são da regra democrática”.

Ok. À parte as questões de estilo, nada a opor. Os petistas é que saíram demonizando os que se manifestaram, acusando-os de reacionários, conservadores, coxinhas, ricos, direitistas, elite… Bem, vocês conhecem os impropérios.
Indagada sobre a manifestação em favor do impeachment, aí Dilma começou a se enrolar:

“Convocar, quem convocar, convoque do jeito que quiser, ninguém controla quem convoca. A manifestação vai ter as características que tiver seus convocadores. Ela, em si, não representa nem a legalidade nem a legitimidade de pedidos que rompem a democracia.”

Dilma está errada. A manifestação é legal — porque assentada em códigos reconhecidos pela ordem jurídica — e é legítima porque reflete uma aflição real de parcelas crescentes da população. O impedimento de um presidente da República está previsto na Constituição e é regulamentado por lei: a 1.079 — que define crimes de responsabilidade. Portanto, não há “rompimento nenhum da democracia”.

Ao fazer uma digressão sobre o mérito do impeachment, afirmou:

“Eu acho que há de caracterizar razões para o impeachment, e não o terceiro turno das eleições. O que não é possível no Brasil é a gente também não aceitar a regra do jogo democrático. A eleição acabou, houve o primeiro e o segundo turnos.”

Isso é tolice das grossas, obra de maus conselheiros — o que não falta por lá. Já expliquei o caminho aqui algumas vezes — um dos posts está aqui — e resumo: qualquer cidadão, é da lei, pode apresentar à Câmara uma denúncia por crime de responsabilidade contra a presidente. Essa denúncia deverá estar acompanhada de provas. Se recebida, será analisada por uma comissão. A tramitação é longa. Se chegar à última etapa, o plenário da Câmara decide: se a denúncia for aceita por, no mínimo, 342 deputados (dois terços), o chefe do Executivo tem de se afastar; se a acusação for de crime comum, vai para o Supremo; se for de crime de responsabilidade, vai para o Senado.

Parte, não a totalidade, é verdade, das pessoas que vão às ruas no domingo acha que Dilma infringiu a Lei 1.079. Eu, por exemplo, acho! Essas pessoas não estão pedindo que ela seja deposta por um golpe militar, mas pela lei. É mentirosa a acusação de que se trata de tentativa de terceiro turno. Não custa lembrar que Collor foi afastado pela Câmara, foi condenado pelo Senado por crime de responsabilidade, mas foi absolvido no Supremo da acusação de crime comum.

É impressionante que a presidente reúna a cúpula política do seu governo e se saia com essa conversa bisonha de “terceiro turno”. Um processo de impeachment, por definição, não é golpe. Um golpe se faz fora da lei. Um processo de impeachment, como o nome diz, é um instrumento do aparato legal.

Essa gente perdeu definitivamente o eixo. Está assustada com o som das caçarolas e sai falando qualquer coisa. Vocês não precisam acreditar em mim. Submetam este texto ao jurista de sua preferência, não importa o viés ideológico, desde que seja intelectualmente honesto.


Por Reinaldo Azevedo

segunda-feira, 9 de março de 2015

Cardozo deseja que Dilma seja vista como tola

De tanto repetirem que Dilma Rousseff, a exemplo de Lula, não sabia de nada, a plateia começa a se questionar:
1. A Petrobras não era o habitat natural de Dilma?
2. A fama de gerentona não nasceu no Ministério de Minas e Energia?
3. Guindada à Casa Civil, a mãe do PAC não fez questão de permanecer na presidência do Conselho de Administração da Petrobras?
4. Eleita presidente da República, a soberana não entregou o comando da Petrobras para Graça Foster, pessoa da sua irrestrita confiança?
5. Se cada uma das perguntas anteriores é respondida com um retumbante “sim”, o que diabos madame fazia que não viu o conluio das maiores empreiteiras do país com os propino-diretores indicados por partidos que abrigam 47 suspeitos de chafurdar na jazida de lama da Roubobras?

Neste sábado (7), Dilma abespinhou-se com o tratamento que recebeu do noticiário. E mandou o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) reafirmar que ela não sabe de nada sobre coisa nenhuma.
Dilma foi citada em depoimentos de dois delatores da Lava Jato: o ex-diretor Paulo Roberto Costa e o doleito Alberto Youssef. Mas o ministro Teori Zavascki, do STF,avalizou o entendimento do procurador-geral Rodrigo Janot segundo o qual, no caso dela, não é possível abrir uma investigação.

Por quê? As menções feitas a Dilma referem-se a fatos da campanha eleitoral de 2010, antes de ser empossada no primeiro mandato, em 2011. E a Constituicão, no parágrafo 4º do artigo 86, anota que um presidente da República, no curso do mandato, não pode ser processado por atos não relacionados ao exercício das suas funções.
O procurador-geral realçou que, conforme entendimento já consolidado no STF, essa proibição para a abertura de investigação é uma imunidade temporária. Remanesce enquanto durar o mandato.
Pois bem. O que disse o delator Paulo Roberto? Contou que, em 2010, o doleiro Youssef lhe trouxe um pedido do grão-petista Antonio Palocci, então coordenador da campanha presidencial de Dilma. Queria que fossem cedidos do caixa de propinas do PP, o Partido Progressista, R$ 2 milhões para a camanha de Dilma. Youssef foi autorizado a realizar o repasse. Ouvido, o doleiro negou que tivesse feito o repasse.
Impedido pela Constituição de pedir a abertura de processo contra Dilma no Supremo, o procurador-geral Janot requereu ao ministro Teori que devolvesse à primeira instância do Judiciário esse pedaço do processo, para que seja apurada a conduta de Palocci. Foi atendido. Assim, caberá ao juiz Sérgio Moro, que cuida da Lava Jato em Curitiba, perscrutar o suposto elo entre a petrorroubalheira e a caixa registradora do comitê de Dilma-2010.
Foi nesse contexto que o ministro da Justiça travestiu-se de advogado de Dilma e veio à boca do palco para declarar, em timbre semi-exaltado, que a decisão do STF deixara claro que não havia nada de errado a apurar na conduta da presidente. Nas suas palavras, ela “não teve pedida, nem decidida qualquer autorização para investigação porque não há fatos, não há indícios que pudessem envolvê-la em absolutamente nada nesse episódio.”
Escorando-se num trecho do despacho de Teori Zavascki, Cardozo acrescentou: “Exatamente por isto, se afirma que nada em relação a ela tem que ser arquivado. Ao contrário de outros arquivamentos em que se fala ‘arquive-se’. Há fatos. Mas arquive-se. Aqui não. Não há fatos. Não há nada a ser arquivado e aí se reforça. Mesmo que houvesse fatos, a Constituição não autorizaria a investigação.”
O ministro prosseguiu: “Portanto, dizer que a presidente Dilma não foi investigada, ou não houve proposta de abertura de inquérito para que ela fosse investigada, porque seria um dispositivo constitucional que impediria, não é verdadeiro. É incorreto, diante da leitura óbvia dos termos dessa decisão. Ela não foi investigada porque não havia fatos. Não foi investigada porque não havia indícios. E se houvessem, aí sim incidiria o dispositivo constitucional.”
Num instante em que a crise econômica converte em vapor a mística da gerente infalível, Cardozo pede, com outras palavras, que, em relação à Petrobras, a plateia continue enxergado Dilma como uma reles tola. Ou cínica. Se houve repasse de verba suja para as arcas da campanha de 2010, Dilma não sabia.
Dilma foi citada também em depoimento do doleiro Youssef. A certa altura, ele afirmou que a presidência da Petrobras e o Palácio do Planalto sabiam do propinoduto que drenava verbas da estatal. Seus inquiridores perguntaram a quem se referia quando citava o Planalto. E o doleiro: Presidência da República, Casa Civil e Minas e Energia. Youssef foi aos nomes: Lula, Gilberto Carvalho, Ideli Salvatti, Gleisi Hoffman, Dilma Rousseff, Antonio Palocci, José Dirceu e Edison Lobão.
O procurador Rodrigo Janot avaliou que não há na declaração do delator Youssef indícios mínimos de que as autoridades citadas soubessem dos fatos. Na falta de evidências mais explícitas, achou que não seria o caso nem de procurar. Decerto esperava que os personagens mencionados tivessem passado procuração em cartório delegando à dupla Paulo Roberto e Youssef poderes para assaltar a Petrobras pelo bem da democracia.
Tudo resolvido, ficou entendido que, no Brasil, quem tem um olho vira diretor da Petrobras. Quem tem dois, compra os diretores da Petrobras. E o pior cego é o que não vê nada e acha só pode ser julgado pelo espelho, um magistrado que perdoa todo mundo. Inclusive os tolos. E os cínicos.
À falta de um enredo plausível, as ruas olham por cima do espelho, saltam as confusões e tiram suas próprias conclusões. Segundo o Datafolha, a grossa maioria dos brasileiros acha que Dilma sabia da corrupção na Petrobras (77%). E assistiu ao saque sem opor resistências (52%).
Josias de Souza