quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

STF deve começar a votar hoje proposta da OAB que contribui para eternizar o PT no poder; tribunal pode ajudar a levar a democracia à breca

Quis o destino que a OAB fizesse uma aliança objetiva com o PT — e pouco me importa se estão conspirando, numa parceria; colaboração objetiva não precisa de conspiração — para golpear a democracia. Um primeiro capítulo pode começar a ser votado nesta quarta, no Supremo.
A OAB recorreu ao STF para que o tribunal declare inconstitucional a doação de empresas privadas às campanhas eleitorais. Mesmo a de pessoas físicas sofreria severas restrições. A matéria está na pauta desta quarta. O relator é o ministro Luiz Fux. Pode começar a ser votada hoje. Qual seria a boa intenção da proposta? Argumenta-se que as empresas doam dinheiro para candidatos esperando, mais tarde, compensações. E isso estaria na raiz da corrupção e de coisas como o mensalão. Parece-me uma soma espetacular de equívocos e de falta de lógica. Em primeiro lugar, é mentira que o mensalão tenha sido financiamento irregular de campanha. Até porque os mensaleiros estavam era pegando mais dinheiro das empresas, e não devolvendo — inclusive de empresa pública. E todos já estavam eleitos.
Em segundo lugar, se as empresas não puderem fazer a doação por dentro, com registro na Justiça Eleitoral, vai acontecer o quê? Ora, aumentará brutalmente a quantidade de dinheiro ilegal nas campanhas, sem registro nenhum. Acabar com o financiamento privado corresponde a pôr as raposas para tomar conta do galinheiro. Em terceiro lugar, se o dinheiro privado não financiar campanhas, tudo terá de sair dos cofres públicos — do nosso bolso. E como definir quanto cada partido receberá? Isso teria de ser feito com base no tamanho da bancada de deputados. PT e PMDB, os maiores partidos, se dariam bem. Os demais estariam numa situação muito difícil.
O instrumento que a OAB usou é a chamada ADI: Ação Direta de Inconstitucionalidade. Recorreu ao STF em 2011. A ação começará a ser julgada agora. Já há muito do nosso dinheiro em campanhas eleitorais: as legendas recebem o chamado Fundo Partidário e há a renúncia fiscal decorrente do horário político e do horário eleitoral gratuitos. Isso tudo pode chegar perto de R$ 1 bilhão de reais em ano eleitoral.
A proposta da OAB, curiosamente, coincide com a do PT, ainda que por outros caminhos. Infelizmente, a Ordem quer impor pela via judicial uma medida que o Congresso, acertadamente, já recusou.
Frente petista
Atenção! O PT alimenta uma campanha para apresentar uma emenda de iniciativa popular instituindo o financiamento público. Assim, a OAB faz a primeira parte do serviço, tentando fazer com que o Judiciário proíba a doação das empresas, e ao Congresso restaria o quê? Aprovar a forma da doação pública.
O PT quer criar um fundo para as eleições, alimentado por verba do Tesouro. Jáescrevi a respeito. O partido do mensalão considera esse dinheiro “sujo”. Ulalá!!! A OAB, que, com frequência, anda a exibir uma biruta torta em matéria de estado democrático e de direito, apoia essa porcaria. Candidamente, fala em divisão igualitária entre os partidos. Sei: legendas grandes como PT, PMDB e PSDB receberiam o mesmo que o PDPN, por exemplo? O que é PDPN? Partido Democrático da Zorra Nenhuma! Tenham paciência! Se assim se fosse, seria estúpido. Sendo como quer o PT, é antidemocrático.
Critério
Algum critério há de haver. O tempo de TV e a fatia do Fundo Partidário são distribuídos segundo o tamanho da bancada dos deputados federais. Poder-se-ia usar esse mesmo para o dinheiro. O PT ficaria feliz. É dono da maior; em seguida, vem o PMDB. Aí o peemedebista tonto fica feliz: “Ah, então ajuda a gente também…”. É?
O PT até chegou a elaborar uma proposta, que não prosperou. Mas ainda não mudou de ideia. O partido quer que a verba pública de campanha seja distribuída levando-se em conta o número total de votos que os partidos obtiveram para deputado. Sim, claro, o PT está na frente! Sua vantagem nesse quesito (16,06 milhões), em relação ao PMDB (12,49 milhões), é maior do que revela o tamanho das bancadas: 88 para o primeiro; 79 para o segundo. No primeiro caso, é de 11%; no segundo, de 28,5%. Só para vocês terem uma ideia: o PMDB teve para deputado federal só um pouco de votos a mais do que PSDB: 12,49 milhões contra 11,33 (10,2%). Ocorre que os tucanos têm uma bancada de 54 deputados, e o PMDB, de 79 (diferença de 46%). Por que é assim? A forma como cada legenda fez suas coligações proporcionais conta, mas não muito. Ocorre que o PSDB elege seus parlamentares mais nos grandes centros, e o PMDB, nos grotões.
Curiosamente, ou nem tanto, esse critério seria ruim para o… PMDB. Há muito o PT quer pôr o seu “aliado” no devido lugar, não é? Mas atenção! Mesmo que se usasse o tamanho das bancadas como critério, os petistas estariam, no médio e no longo prazos, acuando adversários, sim, mas também aliados. Se o Supremo proibir as doações das empresas, estará fazendo um servicinho para o PT. O partido, no entanto, continuaria a ser a única legenda a poder usar dinheiro não público, ainda que de modo sorrateiro. Cansamos de ver, campanha após campanha, a mobilização da máquina sindical, das ONGs e dos movimentos sociais em favor do partido. Ora, isso corresponde, não há como ignorar, a uma doação que pode ser estimada em dinheiro — além de ser intrinsecamente ilegal.
 O PT teria, então, garantida a maior fatia do bolo — o que colaboraria para que continuasse a ser a maior bancada e para fazer as melhores campanhas — e seguiria sendo o depositário da colaboração ilegal dos mecanismos de representação social aparelhados pelo partido. Teria ainda a vantagem da propaganda oficial (incluindo a de estatais), que remete sempre à metafísica partidária. Sim, até o principal aliado do PT, o PMDB, quebraria a cara logo, logo. Ficaria, de saída, com menos dinheiro, estaria impedido de captá-lo no mercado e não teria, por óbvio, a colaboração estimável em dinheiro da máquina aparelhada. Sob a desculpa de barrar a influência de interesses privados nas eleições, o PT quer dar um “golpe” para tentar se eternizar no poder. E a OAB decidiu ser sua parceira.
É claro que, hoje em dia, porque está no poder, os petistas têm mais facilidade para captar recursos. Mas os demais partidos também contam com suas respectivas máquinas, suas lideranças regionais etc. Os doadores aparecem — e não há mal nenhum nisso desde que tudo seja feito às claras. Agora que estão por cima, agora que têm a maior bancada, agora que têm o maior número de votos, os petistas pretendem impedir a livre captação das demais legendas para, obviamente, retirar-lhes a capacidade de concorrer em pé de igualdade.  Infelizmente, as pequenas tendem a ver isso com simpatia porque, para elas, a captação é mesmo mais difícil. Se houver um cartório para cuidar do assunto, melhor. Para as grandes legendas, que podem, em tese, sonhar com a Presidência da República, o financiamento público é um péssimo negócio se for aplicado com seriedade e um risco gigantesco se o for sem seriedade. Sim, meus caros, tenderia a crescer estupidamente a doação ilegal de campanha.
No melhor dos mundos, o pior
E que se note: no melhor dos mundos — todo mundo seguiria a lei, sem caixa dois —, ainda assim, se teria o pior dos mundos. Hoje, o fato de os partidos precisarem de doações privadas também lhes põe alguns freios, não é? Fico cá a imaginar os petistas, como o maior partido, dono da maior bancada e do maior volume de votos com uma montanha de dinheiro para a campanha garantido pelo cartório, sem precisar estabelecer compromissos — refiro-me a compromissos legítimos e democráticos — com ninguém…
Olhem aqui: essa conversa de financiamento público é uma de duas coisas — e não consigo ver a terceira opção: ou é coisa de gente de má-fé ou é coisa de idiotas. Idiota, o PT não é. Ou teria feito essa proposta quando tinha 8 deputados, não quando tem 88.
Por Reinaldo Azevedo

segunda-feira, 9 de dezembro de 2013

Planalto usa a morte de Mandela para propaganda e para ofuscar a truculência política do Brasil real

Bem, a morte de Nelson Mandela anda a produzir mistificações, como escrevi há pouco, mundo afora. E serve até ao proselitismo interno.
A presidente Dilma e os quatro ex-presidentes embarcam para a África do Sul para o velório do líder sul-africano. Todos com um ar, assim, sorridente mesmo. Tenho cá as minhas desconfianças se o decoro não pediria outra coisa. Afinal, não estão rumando para a posse de Mandela, não é? — não, ao menos, aqui na terra; parece que um trono o aguarda no Reino dos Céus; se é que já não chegou a hora de depor Aquele Lá, né?
No Twitter, a equipe de marketing de Dilma aproveita para fazer proselitismo político.
 Que engraçado!!!
Lula e Dilma foram adversários políticos dos três outros ex-presidentes que aparecem na foto, né? O Babalorixá de Banânia esculhambou impiedosamente cada um deles.  E acabou se compondo politicamente com todos eles, menos com… FHC!
Sim, senhores! Vejam a foto. Todos ali, exceto FHC, fazem parte da base aliada. Não por acaso, o tucano é o único que representa um partido que pode ser uma alternativa real de poder. O PT decidiu incorporar as qualidades de Sarney. O PT decidiu incorporar as qualidades de Collor. O PT só não quer saber das qualidades de… FHC!
Eu sou chato mesmo! Acho que sempre é tempo de pensar. Essa gente unida e sorridente da foto não espelha o Brasil real. Acaba de vir a público uma história escabrosa sobre a forma como o PT usa a estrutura do estado para destruir adversários. Até Ruth Cardoso, mulher de FHC, foi alvo da baixaria. Há dois ou três dias, num evento público, Lula se referiu à cocaína encontrada no helicóptero da família Perrella como “coisa do lado de lá” — como se fosse um problema da oposição.
Dilma diz no Twitter que a viagem é um exemplo de que “as divergências do dia-a-dia não contaminam as questões de Estado”. Com a devida vênia, não caio nessa. Fazer dossiê contra adversários e vazá-los não é coisa de “divergência do dia-a-dia”; sugerir que os adversários estão ligados ao tráfico de drogas também não. Nesse caso, seria melhor não fazer a viagem coletiva e ter mais respeito pelos adversários.
A morte de Mandela não me impede de ver o que acontece na África do Sul.
A morte de Mandela não me impede de ver o que acontece no Brasil.
Por Reinaldo Azevedo

Será que Dirceu tem mesmo o “direito” de trabalhar fora? Vamos ver o que dizem as leis e o STF. Ou: Tem de valer para ele o que valeu para PC Farias. Ou ainda: Que tal fazer tijolo?

José Dirceu desistiu de trabalhar no Hotel St. Peter, como vocês já sabem. A sua defesa divulgou uma nota à imprensa que, mais uma vez, vem vazada naquele tom condoreiro que está se tornando tão característico. José Luís de Oliveira Lima, seu advogado, não economiza. Diz que a oferta do hotel cumpria os requisitos legais, mas que “mesmo assim, foi tratada por setores da mídia como uma farsa”. E acrescenta: “Essa atitude denuncia a intenção de impedir que o ex-ministro trabalhe, direito que lhe é garantido pela lei”.
É… Não é bem assim. Vamos ver.
As respectivas defesas dos mensaleiros têm sido muito hábeis em ficar brandindo a lei, atribuindo-lhe, inclusive, conteúdos que não estão lá. Foi assim, por exemplo, com a cascata que sustentava que “ato de ofício”, para caracterizar corrupção passiva ou ativa, era sinônimo de documento assinado. Estava errado. A assinatura que caracteriza uma vantagem indevida é, na verdade, um elemento que agrava a pena. A simples expectativa a de um benefício irregular a ser oferecido (corrupção ativa) ou recebido (passiva) já é crime. É o que está no caput dos artigos 317 e 333 do Código Penal.
Agora, a defesa de Dirceu trata a possibilidade de ele trabalhar como um direito líquido e certo, que não depende da decisão do juiz. Não é o que diz a lei. Nem é esse o entendimento do Supremo. Abaixo, segue um trecho do Habeas Corpus 72.565-1, de que foi relator o então ministro Sepúlveda Pertence. A defesa de PC Farias — sim, o tesoureiro de Fernando Collor — pedia que seu cliente, que estava no regime semiaberto, tivesse o direito de sair para trabalhar, nos moldes do que quer fazer José Dirceu. 
Retomo
1: Assim, decidiu o Supremo que o trabalho diário, como quer Dirceu, é COISA DO REGIME ABERTO, NÃO DO SEMIABERTO;
2: O trabalho pode ser admitido? Até pode, mas não lhe é próprio.
Reproduzo os artigos do Código Penal citados pelo ministro:
Art. 35 – Aplica-se a norma do art. 34 deste Código, caput, ao condenado que inicie o cumprimento da pena em regime semiaberto.
§ 1º – O condenado fica sujeito a trabalho em comum durante o período diurno, em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar.
§ 2º – O trabalho externo é admissível, bem como a frequência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior.
Art. 36 – O regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado.
§ 1º – O condenado deverá, fora do estabelecimento e sem vigilância, trabalhar, freqüentar curso ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga.
§ 2º – O condenado será transferido do regime aberto, se praticar fato definido como crime doloso, se frustrar os fins da execução ou se, podendo, não pagar a multa cumulativamente aplicada.
Mas não só isso
Entenderam os ministros que, para que se conceda a licença, é preciso que o condenado cumpra ao menos um sexto da pena. O que diz a Lei de Execução Penal? Isto:
Art. 37. A prestação de trabalho externo, a ser autorizada pela direção do estabelecimento, dependerá de aptidão, disciplina e responsabilidade, além do cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena.
Segundo Sepúlveda Pertence, portanto, só depois que o condenado cumpre um sexto da pena, em regime fechado ou semiaberto, é que se PODE conceder o benefício do trabalho externo. No caso do preso em regime fechado, só em obra pública. O do semiaberto pode trabalhar em empresa privada.
Assim, se valer para José Dirceu o que valeu para PC Farias, ele só poderá trabalhar fora da cadeia depois de cumprir um sexto da pena. Se é de lei que Oliveira Lima quer falar…
Sonho de Liberdade
Mas nem tudo está perdido para José Dirceu, Delúbio Soares e José Genoino. A cooperativa “Sonho de Liberdade”, formada por 80 presidiários, formalizou no STF oferta de emprego para o trio petista. No caso do ex-ministro da Casa Civil, o cargo oferecido é o de administrador da parte de fabricação de artefatos de concreto, com salário de 508,50 reais, vale-transporte e refeição no local de trabalho. Delúbio teria as mesmas vantagens na marcenaria. E Genoino costuraria bolas. A R$ 5 cada uma.
Humilhação? Não posso crer que três gigantes do Partido dos Trabalhadores tenham mácula de ofício. Um ex-metalúrgico já foi presidente da República. Por que um ex-ministro não pode fazer tijolo?
Por Reinaldo Azevedo