O
presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), deve pôr em votação
nesta quarta o Decreto Legislativo da Câmara que torna sem efeito o decreto
presidencial 8.243 — aquele
arroubo bolivariano de Dilma Rousseff —, que submete, ainda que de forma
oblíqua, as decisões do governo federal a conselhos populares. Trata-se de uma
óbvia usurpação dos poderes do Congresso pelo Executivo. Já tratei do assunto
aqui muitas vezes. A Constituição estabelece, sim, a participação direta da
população por meio de três instrumentos: plebiscitos, referendos e emendas de
iniciativa popular. Os conselhos, na forma como quer o decreto de Dilma,
simplesmente substituem a democracia representativa pela democracia direta.
À Folha, afirmou Alves: “O
decreto está em desarmonia com o princípio da separação dos Poderes, pois ao
Congresso Nacional cabe, precipuamente, formulação de políticas públicas, por
meio de lei, após amplo debate entre todas as forças políticas — da situação e
da oposição — sobre as mais diversas demandas de todos e quaisquer grupos da
sociedade, alinhados ou não, ao governo”. É só uma questão de bom senso.
Nesta terça, Gilberto Carvalho,
secretário-geral da Presidência, esteve com Alves. O deputado voltou a defender
a retirada do texto, mas o governo deixou claro que não negocia. O presidente
da Câmara lamentou: “Esperava compreensão do governo, mas não foi possível”.
Não custa lembrar trechos do
monstrengo dilmiano. O Artigo 1º do decreto estabelece: “Fica instituída a Política Nacional de Participação Social –
PNPS, com o objetivo de fortalecer e articular os mecanismos e as instâncias
democráticas de diálogo e a atuação conjunta entre a administração pública
federal e a sociedade civil”.
Sei… O Inciso II do Artigo 3º sustenta ainda que uma das diretrizes do PNPS é a “complementariedade, transversalidade e integração entre
mecanismos e instâncias da democracia representativa, participativa e direta”.
Certo! Então os conselhos
seriam uma forma de democracia direta, né? Só que é a democracia direta que se
realiza à socapa, sem que ninguém saiba. Ou o “cidadão” decide fazer parte de
algum “coletivo” ou “movimento social” ou não vai participar de coisa nenhuma.
O texto tem o topete de definir o que é sociedade civil logo no Inciso I do
Artigo 2º: “o cidadão, os coletivos, os movimentos sociais
institucionalizados ou não institucionalizados, suas redes e suas organizações”.
Ou por outra: é sociedade civil tudo aquilo que o poder decidir que é; e não é
o que ele decidir que não é.
Fim
da propriedade privada
Como observei numa coluna na Folha, O “indivíduo” só aparece no decreto para que possa ser rebaixado diante dos “coletivos” e dos “movimentos sociais institucionalizados” e “não institucionalizados”, seja lá o que signifiquem uma coisa, a outra e o seu contrário. Poucos perceberam que o decreto institui uma “justiça paralela” por intermédio da “mesa de diálogo”, assim definida: “mecanismo de debate e de negociação com a participação dos setores da sociedade civil e do governo diretamente envolvidos no intuito de prevenir, mediar e solucionar conflitos sociais”.
Ai, ai, ai… Como a Soberana já
definiu o que é sociedade civil, podemos esperar na composição dessa mesa o
“indivíduo” e os movimentos “institucionalizados” e “não institucionalizados”.
Se a sua propriedade for invadida por um “coletivo”, por exemplo, você poderá
participar, apenas como uma das partes, de uma “mesa de negociação” com os
invasores e com aqueles outros “entes”. Antes que o juiz restabeleça o seu
direito, garantido em lei, será preciso formar a tal “mesa”…
Isso tem história. No dia 19 de
fevereiro, o ministro Gilberto Carvalho participou de um seminário sobre
mediação de conflitos. Com todas as letras, atacou a Justiça por
conceder liminares de reintegração de posse e censurou o estado brasileiro por
cultivar o que chamou de “uma mentalidade que se
posiciona claramente contra tudo aquilo que é insurgência“.
Ou por outra: a insurgência lhe é bem-vinda. Parece que ele tem a ambição de
manipulá-la como insuflador e como autoridade.
Vocês se lembram do “Programa
Nacional-Socialista” dos Direitos Humanos, de dezembro de 2009? É aquele que,
entre outros mimos, propunha mecanismos de censura à imprensa. Qual era o Objetivo Estratégico VI?
Reproduzo trecho:
“a- Assegurar a criação de marco legal para a prevenção e mediação de conflitos fundiários urbanos, garantindo o devido processo legal e a função social da propriedade.
(…)
d- Propor projeto de lei para institucionalizar a utilização da mediação como ato inicial das demandas de conflitos agrários e urbanos, priorizando a realização de audiência coletiva com os envolvidos (…) como medida preliminar à avaliação da concessão de medidas liminares (…)”
Dilma voltou à carga, resolveu
dar uma banana para o Congresso e, em vez de projeto de lei, que pode ser
emendado pelos parlamentares, mandou logo um decreto.
Que a Câmara tenha a decência
de repudiar esse arroto autoritário!
Por Reinaldo Azevedo
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