O
Tribunal Superior Eleitoral sumiu com os pareceres técnicos que sugeriam a
reprovação das contas do PT na época do mensalão e da campanha da presidente
Dilma, em 2010. Documentos revelam que isso ocorreu por determinação do
ministro Ricardo Lewandowski
Por
Rodrigo Rangel, na VEJA desta semana:
Em
outubro do ano passado, o Supremo Tribunal Federal monopolizava as atenções do
país quando alinhavava as últimas sentenças aos responsáveis pelo escândalo do
mensalão. Naquele mesmo mês, só que em outra corte de Justiça e bem longe dos
holofotes, um auditor prestava um surpreendente depoimento, que jogava luz
sobre episódios ainda nebulosos que envolvem o maior caso de corrupção da
história. O depoente contou que, em 2010, às vésperas da eleição presidencial,
foi destacado para analisar as contas do PT relativas a 2003 – o ano em que se
acionou a superengrenagem de corrupção. Foi nessa época que Delúbio Soares,
Marcos Valério, José Genoino e o restante da quadrilha comandada pelo
ex-ministro José Dirceu passaram a subornar com dinheiro público parlamentares
e partidos aliados. Havia farto material que demonstrava que a contabilidade do
partido era similar à de uma organização criminosa. Munido de documentos que
atestavam as fraudes, o auditor elaborou seu parecer recomendando ao tribunal a
rejeição das contas. O parecer, porém, sumiu – e as contas do mensalão foram
aprovadas.
Menos
de dois meses depois, ocorreu um caso semelhante, tão estranho quanto o dos
mensaleiros, mas dessa vez envolvendo as contas da última campanha presidencial
do PT. O mesmo auditor foi encarregado de analisar o processo. Ao conferir as
planilhas de gastos, descobriu diversas irregularidades, algumas formais,
outras nem tanto. Faltavam comprovantes para justificar despesas da campanha. A
recomendação do técnico: rejeitar as contas eleitorais, o que, na prática,
significava impedir a diplomação da presidente Dilma Rousseff, como determina a
lei. Ocorre que, de novo, o parecer nem sequer foi incluído no processo – e as
contas de campanha foram aprovadas. As duas histórias foram narradas em
detalhes pelo auditor do Tribunal Superior Eleitoral, Rodrigo Aranha Lacombe,
em depoimento ao qual VEJA teve acesso. Ambas cristalizam a suspeita de que a
Justiça Eleitoral manipula pareceres técnicos para atender a interesses
políticos – o que já seria um escândalo. Mas há uma acusação ainda mais grave.
A manipulação que permitiu a aprovação das contas do mensalão e da campanha de
Dilma Rousseff teria sido conduzida pessoalmente pelo então presidente do TSE,
o ministro Ricardo Lewandowski.
(…)
(…)
VEJA
teve acesso a outros documentos ainda mais contundentes, incluindo mensagens
eletrônicas despachadas pelo próprio Lewandowski, que revelam o empenho dele na
aprovação das contas de campanha da presidente Dilma Rousseff. Faltavam dez
dias para a cerimônia de diplomação da presidente eleita. Nas mensagens
trocadas com assessores. o ministro, que nada tinha a ver com o processo, cujo
relator era o juiz Hamilton Carvalhido. demonstra irritação com o teor do
parecer que pedia a rejeição das contas — um “problemão”, nas palavras dele.
“Não estamos lidando com as contas de um “boteco” de esquina. mas de um comitê
financeiro de uma presidente eleita com mais de 50 milhões de votos. Se fosse
assim, contrataríamos um técnico de contabilidade de bairro”, escreveu o
ministro a Patrícia Landi, sua funcionária de confiança e então diretora-geral
do TSE.
Em
outra mensagem, em resposta a uma minuta que acabara de receber apontando
justamente as irregularidades nos documentos apresentados pelo PT, o ministro
estrila: “Não entendi! Qual a diferença entre faturas e notas fiscais para o
efeito de prestação de contas? É uma irregularidade insanável? As despesas no
têm origem? Foram fraudadas?”. Ele segue indagando: “Quais as consequências
práticas dessa desaprovação? Não seria possível a aprovação com ressalvas ou
essa era a única alternativa? De quem foi a decisão? Qual a repercussão desse
parecer sobre a diplomação dos candidatos eleitos?”. “Quero receber explicações
detalhadas por ocasião do meu retorno na quarta-feira”, arremata o ministro, em
tom imperial. Diligente, Ricardo Lewandowski estava em viagem ao exterior.
“Assim que voltou a Brasília, ele reuniu os chefes do setor e ordenou as alterações
nos pareceres”, disse a VEJA um graduado funcionário da área técnica.
(…)
(…)
Nesta
semana, o Supremo Tribunal Federal retoma a parte final do julgamento dos
mensaleiros. Analisará os últimos recursos dos 25 réus condenados a cadeia.
Provavelmente serão reeditados os acalorados debates entre o relator do
processo, o ministro Joaquim Barbosa, e o revisor Ricardo Lewandowski. que
sempre defendeu a absolvição dos principais acusados.
Por Reinaldo Azevedo
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