É
preciso ser idiota ou ter muita má-fé — eventualmente uma soma das duas coisas
— para sustentar que o fim da doação legal de empresas a campanhas eleitorais
diminuiria a corrupção no Brasil. Em primeiro lugar, ainda que venham a ser
proibidas — e o STF está a um passo de fazer essa escolha estúpida —, as
doações continuarão a ser feitas, só que por baixo do pano. Em segundo lugar, a
roubalheira maior nada tem a ver com eleição. Ela se dá por intermédio das
empresas estatais, como prova a Petrobras, e das ONGs que são usadas pelos
partidos.
A
VEJA desta semana traz uma reportagem que revela os bastidores escabrosos de
uma ONG chamada Instituto Brasil, criada em 2004 para supostamente facilitar a
construção de casas próprias, com dinheiro federal, para pessoas de baixa renda
na Bahia. Assim era no papel. De fato, a dita-cuja era apenas um dos braços do
PT que operava para desviar dinheiro dos cofres públicos para o bolso dos
petistas. Quem faz a denúncia? Não é o PSDB. Não é algum outro partido de
oposição. Quem põe a boca no trombone é Dalva Sele Paiva, nada menos do que
presidente da entidade. Ela cuidou do esquema para os petistas até 2010, quando
o Instituto Brasil foi fechado, atolado em irregularidades. Ao longo de seis
anos, segundo ela, R$ 50 milhões — SIM, CINQUENTA MILHÕES DE REAIS — saíram dos
cofres do governo federal para as burras dos companheiros.
O
esquema era relativamente simples. O Instituto Brasil era qualificado pelo
governo para construir, por exemplo, um número x de casas. Erguia muito menos,
repassava o dinheiro para a companheirada, e o próprio partido se encarregava
de arrumar as notas frias que justificavam as despesas. Assim foi, por exemplo,
em 2008, num caso já desvendado pelo Ministério Público Federal. O Instituto
Brasil foi escolhido pelo governo para erguer 1.120 casas ao custo de R$ 17,9
milhões. O dinheiro saiu do Fundo de Combate à Pobreza. O MP já tem provas de
que parte do dinheiro sumiu. Atenção! Só nesse convênio, revela Dalva à VEJA,
R$ 6 milhões foram parar nos cofres do PT, consumidos na eleição municipal. Ela
deixa claro que a entidade foi criada com o propósito de alimentar o caixa do
partido. E tudo passou a funcionar ainda melhor para o grupo depois da eleição
do petista Jaques Wagner para o governo da Bahia, em 2006.
A
investigação está a cargo da promotora Rita Tourinho, que chegou a localizar
testemunhas que acusavam políticos, mas, diz ela, faltavam as provas. Parece
que a tarefa agora será facilitada. Diz Dalva, que presidia a ONG: “Vou levar
todos esses fatos ao conhecimento do Ministério Público. Quero encerrar esse
assunto, parar de ser perseguida. O ônus ficou todo comigo”. Ela diz ter em
mãos, por exemplo, os recibos de R$ 260 mil repassados à campanha do agora
senador Walter Pinheiro à Prefeitura de Salvador, em 2008.
Não
era só Walter Pinheiro, é claro! Atenção para a lista de outros petistas que,
segundo Dalva, receberam o dinheiro que deveria ter sido usado na construção de
casas para os pobres:
– Afonso Florence, deputado federal e ex-ministro da Reforma Agrária de Dilma. Dalva diz ter entregado a ele várias pacotes de dinheiro de R$ 20 mil a R$ 50 mil, quando era secretário de Jaques Wagner. Um assessor seu chamado Adriano teria recebido a bufunfa;
– Vicente José de Lima Neto, presidente da Embratur: recebeu pensão mensal de R$ 4 mil;
– Rui Costa, atual candidato ao governo da Bahia: pensão mensal de R$ 3 mil a R$ 5 mil;
– Nelson Pellegrino, deputado federal: recebeu dinheiro para boca de urna, para pagar cabo eleitoral e bancar outras despesas da campanha.
E o
governador Jaques Wagner? Será que ele sabia? Dalva diz que era impossível não
saber. Afinal, quem arrumava as notas frias que justificavam os gastos era a
então diretora da Secretaria de Desenvolvimento Urbano, Leda Oliveira. Hoje,
Lêda é ainda mais poderosa: ocupa o cargo de diretora de Comunicação do
governador Jaques Wagner.
Todos
os acusados negam tudo com veemência. O deputado Nelson Pellegrino, por
exemplo, começou afirmando que nem conhecia a tal Leda. Chamou pela memória e
acabou lembrando que uma irmã sua trabalhou no Instituto Brasil: “Mas eu pedi
para ela sair quando descobri como eram as coisas lá”. Então quer dizer que ele
sabia como eram as coisas por lá?
Vamos
ver no que vai dar a investigação do Ministério Público. A mulher que cuidava
da dinheirama contou tudo, mesmo sabendo que também está confessando um crime.
Só não aceita cair sozinha.
Por Reinaldo Azevedo
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