Ai, ai…
Lula nunca teve limites e sempre
se beneficiou disso. E, é evidente, muita gente permitiu que não tivesse. Então
ele segue adiante. O homem participou, ao lado de Felipe González, ex-primeiro
ministro da Espanha, do Fórum “Novos Desafios da Sociedade”, promovido pelo
jornal “Valor Econômico”. Antes que fale sobre ele propriamente, um comentário
sobre o espírito do tempo. Acho o máximo os nomes desses fóruns. Sempre tem um
“novo alguma coisa”. Imaginem como seria constrangedor para a nossa
inteligência fazer fóruns sobre os “velhos desafios” que não superamos. Vamos
ver:
“O Velho Desafio da Educação de
Qualidade”;
“O Velho Desafio da Eficiência dos Portos”;
“O Velho Desafio de uma Tributação não Extorsiva”…
“O Velho Desafio da Eficiência dos Portos”;
“O Velho Desafio de uma Tributação não Extorsiva”…
E vai por aí. Debater o
presente é chato. Erra-se com mais grandeza e com mais generosidade sobre o
futuro. Ninguém cobra nada. Nunca ninguém perdeu dinheiro no Brasil sendo um
mau profeta. Nem dinheiro nem poder, né, Guido? Eita! Vontade de ficar falando
sobre esse assunto divertido em vez de ocupar meu tempo com Lula, mas é necessário
porque apontar a sua mais recente hipocrisia é um dever cívico.
Na presença do espanhol, vejam
vocês!, Lula reconheceu que houve avanços no governo FHC… Ah, bom! Espero que
tucanos não saiam alardeando isso por aí como um diploma de aprovação: “Vejam o
que ele disse!”. Quando começar o processo de demonização da oposição e do
passado, na campanha eleitoral, aí quem sabe se possam resgatar as raras vezes
em o próprio Lula e Dilma disseram a verdade sobre a história — ainda que
verdade tímida. “Avanços” é uma palavra-gaveta. Cabe qualquer coisa aí. Qual
avanço? Que proposta tinha o PT à época para dar um jeito na inflação, por
exemplo, e o que o partido fez durante o lançamento do Real?
Lula só estava evitando parecer
bronco, imbecil mesmo!, diante de um convidado ilustre, que conhece o mundo.
Fora das quatro paredes daquele evento, retomará a sua ladainha de sempre
contra o passado, as elites etc. A própria Dilma, para consumo interno, aderiu
à farsa, negando até a evidência escandalosa de que o cadastro único dos
atendidos por programas sociais começou a ser elaborado no governo FHC.
Não pensem que Lula mudou, que Lula aprendeu, que Lula passou a ser mais justo.
Ele distingue muito bem as esferas: o discurso para plateias selecionadas é
diferente da fala palanqueira. A diferença não é só de estilo, mas também de
conteúdo.
Financiamento público de campanha
Lula, segundo informa Paulo Gama, na Folha, voltou a defender a farsa do
financiamento público de campanha como princípio, entende-se, de moralização da
política. O homem fartamente financiado por empreiteiras para correr o mundo
“em defesa dos interesses nacionais” — e, claro! nesse caso, não vê mal nenhum!
— tenta nos convencer de que a mãe de toda corrupção é o financiamento privado
— e legal!!! — de campanha, o que é mesmo um piada.
O problema, desde sempre, é o
financiamento ilegal, não é mesmo? De campanhas e de eleitos, prática que não
pode ser punida por uma Justiça Eleitoral que não tem lá tantos instrumentos.
Alguém pode explicar, com base na lógica, por que o financiamento público
impediria o caixa dois? Ninguém consegue. Quando se proibirem formalmente as
doações privadas, haverá, isto sim, é uma explosão de financiamentos ilegais
porque alguns que hoje contribuem dentro da lei vão migrar para a
clandestinidade. E, evidente, os cofres públicos serão sangrados um pouco mais.
Entre repasses do fundo
partidário e as compensações fiscais para os veículos de radiodifusão tanto
para o horário político como para o horário eleitoral, o estado brasileiro já
gasta algo que roça aí no meio bilhão de reais a cada ano. Assim, já existe
financiamento público — não na dimensão pretendida pelo Apedeuta.
Mais: é claro que ele não faria
uma proposta dessas naqueles tempos em que o PT tinha oito deputados. Hoje,
é o maior partido da Câmara, e a divisão do dinheiro destinado à eleição teria
de obedecer a algum critério. O tamanho da bancada já regula a distribuição do
tempo de TV e do fundo partidário. Certamente seria quesito fundamental também
na repartição da verba destinada à eleição. Agora que o PT chegou lá, quer
mudar as leis para… não sair mais de lá.
Imaginemos uma lei que
funcionasse à perfeição, só com financiamento público: com mais dinheiro, o PT
teria melhores condições de enfrentar as outras legendas, e isso faria com que
tivesse mais condições de permanecer como maior legenda; uma vez sendo a maior,
terá mais verba… E estaria criado o círculo vicioso do poder eterno…
Audácia do Apedeuta
Lula, o presidente do MSL — o Movimento dos Sem-Limite —, foi
longe. O brasileiro mais fartamente financiado pelo capital privado de que se
tem notícia na história (e, à diferença de Eike Batista, o de hoje em dia, nem
precisa apresentar resultados…) se diz contra a financiamento privado de
campanhas. Dinheiro de empresas e de particulares, ele só acha legítimo quando
patrocina esta instituição da humanidade chamada “Luiz Inácio Lula da Silva”.
Nesse caso, tudo bem! Aí é por uma boa causa!
Fora disso, ele é contra.
Ousaria dizer, violando a língua, que ele é “contríssimo”!!! Tanto que, segundo
disse, o financiamento privado de campanhas eleitorais deveria ser “crime
inafiançável”. Já o financiamento público de algumas empresas privadas, bem,
nesse caso, ele pode ceder um pouco. Afinal, não nos esqueçamos de que as
andanças do lobista Lula geram despesas para os cofres públicos, conforme já
ficou demonstrado.
Qualquer outro que fosse
flagrado na situação em que Lula foi no caso das empreiteiras não falaria de
corda em casa de enforcado. Com ele, é diferente. Isso mais o anima a defender
o que seria, então, um privilégio só a ele mesmo concedido: o farto
financiamento privado. Lula, já escrevi centenas de vezes, nada tem de burro.
Mas é espantoso o que este senhor concorre para emburrecer a política!!!
PS – Ah, sim:
ele também recomendou cuidado com esse negócio de combate à corrupção. Deu a
entender que vê muito falso moralismo e diz que alguns que acusam são piores do
que os acusados. Ele só não quis falar dos que foram mesmo flagrados, com
provas. As alianças que o PT fez nos últimos dez anos demonstram, com efeito,
que o PT vê esse negócio de corrupção sem preconceitos.
Texto
publicado originalmente às 20h11 desta terça
Por Reinaldo Azevedo
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